Morre Chica, "peixe-boi da Praça do Derby"
Aos 52 anos, peixe-boi fêmea Xica morre em Itamaracá, PE
Animal era considerado o mais antigo vivendo em cativeiro, no País.
Centro de Mamíferos Aquáticos não passou detalhes sobre causa da morte.
Do G1 PE
Xica, peixe-boi fêmea (Foto: Reprodução / TV Globo)
Xica, peixe-boi fêmea,
viveu por 22 anos em um tanque inadequado na Praça do Derby, no Recife,
antes de ser transferida para o Centro de Mamíferos Aquáticos, em
Itamaracá (Foto: Reprodução / TV Globo)
A peixe-boi fêmea Xica,
52 anos, a mais antiga a viver em cativeiro no Brasil, morreu ontem
domingo (14), no Centro de Mamíferos Aquáticos de Itamaracá, na Região
Metropolitana do Recife. O animal ficou famoso nos anos 1970, quando
vivia em um tanque na Praça do Derby, na capital.
O Centro de Mamíferos
Aquáticos (CMA) confirmou a morte, mas não passou mais detalhes sobre
suas causas. "A previsão é que a necrópsia seja feita na segunda-feira,
mas não tem um horário preciso, porque estamos esperando os
profissionais que vêm de São Paulo, para trabalhar junto com a equipe
daqui", contou Fábia Luna, coordenadora do CMA. O laudo emitido após o
exame vai trazer o horário e a causa da morte.
Depois de uma longa
campanha que teve direito até a processo na justiça, Xica foi
transferida para Itamaracá, no início dos anos 1990. No Recife, o tanque
em que ela viveu por 22 anos era pequeno e raso, o que prejudicou o
desenvolvimento pleno de seus movimentos. Tendo chegado ao local ainda
na adolescência, Xica acabou sofrendo uma deformação na coluna -- porque
só nadava em círculos, sem mergulhar. Uma vez, quando o tanque foi
esvaziado para limpeza, ela acabou queimando a pele ao se virar no
local, o que lhe rendeu uma cicatriz no dorso.
Xica se perdeu da mãe
ainda filhote e ficou presa em uma espécie de armadilha para peixes em
uma casa de praia em Pontas de Pedra, Goiana, Litoral Norte
pernambucano. Em uma reportagem especial feita pelo programa Nordeste
Viver e Preservar em 2013, por ocasião dos 50 anos de Xica, o juiz
Márcio Rabelo lembrou como foi ver um peixe-boi pela primeira vez. "A
água estava turva, aquilo subiu e vi que tinha duas narinas. Uma coisa
diferente, um animal do mar que tem narinas. Foi uma surpresa total",
relembrou. Ele tinha 14 anos na época e a armadilha estava instalada na
casa de seu pai.
Por sete anos, Xica
viveu em um tanque nesse imóvel. Nessa época, pensava-se que ela era um
macho, e seu nome então era Chico. Apesar da matança de peixes-boi ser
comum, a família decidiu mantê-la, até que terminou transferida para a
Praça do Derby. A consciência ambiental não era como conhecemos hoje, e
isso gerou muito sofrimento para o animal. Fora o tamanho do tanque, bem
menor do que o necessário, nem sempre Xica recebia alimentação
adequada. Também sabe-se que ela sofreu cortes e machucados causados
pela população que ia visitá-la. A queimadura em seu dorso foi causada
quando os tratadores esvaziaram o tanque para limpá-lo, em uma
demonstração de que nem os responsáveis diretos por ela sabiam muito bem
como lidar com um peixe-boi.
A Associação
Pernambucana de Defesa da Natureza (Aspan) tomou a dianteira para
conseguir a transferência de Xica. A campanha foi intensa, visto que a
peixe-boi fêmea era uma "celebridade" no Recife dos anos 1970 e 1980.
Até uma simulação foi feita, usando um boneco, um guindaste e um
caminhão, para mostrar como seria possível para o Ibama levá-la até o
Centro de Mamíferos Aquáticos, em Itamaracá. A briga foi parar na
justiça e, dez anos depois, foi determinada a transferência para o CMA. A
operação levou um dia inteiro -- ao chegar em seu novo tanque, agora
com tamanho adequado, Xica pôde mergulhar pela primeira vez, aos 30
anos.
Peixe-boi Xica pariu três filhotes, mas nenhum deles sobreviveu (Foto: Reprodução / TV Globo)
Peixe-boi Xica pariu três filhotes, mas nenhum deles sobreviveu (Foto: Reprodução / TV Globo)
A peixe-boi mais famosa
do Recife chegou a Itamaracá pesando 300 quilos -- quando, normalmente,
um peixe-boi pode alcançar até 1 tonelada e 4,5m de comprimento.
Rapidamente ela ganhou peso, graças às refeições regulares de legumes
que lhe eram servidas. Depois de tanto tempo em sofrimento, Xica virou
um animal ressabiado, que interagia menos do que os outros e preferia
ficar sozinha em seu tanque. Mesmo assim, pariu três vezes, mas nenhum
de seus filhotes sobreviveu.
Xica nunca se curou do
desvio na coluna e as cicatrizes no dorso também a acompanharam até o
fim. Apesar de ter recuperado seu peso e se tornado um animal saudável,
toda uma vida em cativeiro tiraram dela a possibilidade de ser devolvida
à natureza. Segundo os especialistas do CMA, ela não se adaptaria ao
habitat natural, novamente.
Risco de extinção
O peixe-boi está
ameaçado de extinção no Brasil. O projeto Peixe-boi Marinho foi criado
pelo governo federal nos anos 1980, para tentar reverter essa situação.
Na década de 1990, pesquisas apontavam que a costa do país possuía uma
população de apenas 500 animais, já estando extinto nos estados do
Espírito Santo, Bahia e Sergipe. No início de 2013, novos estudos
mostravam que o número havia crescido: cerca de mil peixes-boi já viviam
no litoral brasileiro.
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