Recentemente, comentei sobre a contribuição previdenciária dos jovens maiores de 16 anos e menores aprendizes a partir de 14 anos. Nesse artigo, também mencionei sobre a possibilidade do cômputo do trabalho em idade inferior ao permitido, em decorrência da ACP n. 5017267-34.2013.404.7100/RS e da Portaria n. 7/2020 do INSS.
Como gosto de mantê-los atualizados, no artigo de hoje vou falar exatamente sobre o posicionamento adotado nesse julgamento, que com certeza beneficiará muitos segurados!
Caso queira conferir, o artigo completo sobre contribuição de menor de idade ao INSS (inclusive tratando sobre esta atualização) está lá no blog!
*Publicado primeiro no blog Desmistificando o Direito: Menor de idade pode contribuir para o INSS?
1) Julgamento do STJ sobre cômputo do trabalho rural do menor de 12 anos de idade
Como comentei, o INSS adota o entendimento de que o trabalho rural de menores de 12 anos idade com familiares não gera efeitos previdenciários, sendo considerado como mera colaboração.
Contudo, no julgamento do Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial n. 956.558/SP, o STJ adotou entendimento diverso ao da autarquia federal em relação ao trabalho de menores de 12 anos no meio rural.
Na ocasião, a Corte Superior reafirmou o posicionamento que vem sendo adotado em seus julgados e o aplicou também em relação ao labor rural. Assim, dispôs que o tempo de trabalho rural deve ser reconhecido sem limitação de idade mínima, a fim de conferir maior proteção às crianças, atendendo ao espírito protetivo das normas previdenciárias.
O Ministro Relator Napoleão Nunes Maia Filho, apontou:
"A rigor, não há que se estabelecer uma idade mínima para o reconhecimento de labor exercido por crianças e adolescentes, impondo-se ao julgador analisar em cada caso concreto as provas acerca da alegada atividade rural, estabelecendo o seu termo inicial de acordo com a realidade dos autos, e não em um limite mínimo de idade abstratamente preestabelecido". (g.n.)
A partir do mencionado entendimento, será maior a probabilidade de se obter pela via judicial a revisão do valor da aposentadoria percebida, ou até mesmo o reconhecimento desse tempo de trabalho rural para o segurado conseguir se aposentar antes do período até então previsto.
Confira a ementa:
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. TRABALHADOR URBANO. CÔMPUTO DO TRABALHO RURAL ANTERIOR À LEI 8.213/1991 SEM O RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TRABALHO RURAL ANTERIOR AOS 12 ANOS DE IDADE. INDISPENSABILIDADE DA MAIS AMPLA PROTEÇÃO
PREVIDENCIÁRIA ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES. POSSIBILIDADE DE SER COMPUTADO PERÍODO DE TRABALHO PRESTADO PELO MENOR, ANTES DE ATINGIR A IDADE MÍNIMA PARA INGRESSO NO MERCADO DE TRABALHO. EXCEPCIONAL PREVALÊNCIA DA REALIDADE FACTUAL DIANTE DE REGRAS POSITIVADAS PROIBITIVAS DO TRABALHO DO INFANTE. ENTENDIMENTO ALINHADO À ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DA TNU. ATIVIDADE CAMPESINA DEVIDAMENTE COMPROVADA. AGRAVO INTERNO DO SEGURADO PROVIDO.
1. Cinge-se a controvérsia em reconhecer a excepcional possibilidade de cômputo do labor de menor de 12 anos de idade, para fins previdenciários. Assim, dada a natureza da questão envolvida, deve a análise judicial da demanda ser realizada sob a influência do pensamento garantístico, de modo a que o julgamento da causa reflita e espelhe o entendimento jurídico que confere maior proteção e mais eficaz tutela dos direitos subjetivos dos hipossuficientes.
2. Abono da legislação infraconstitucional que impõe o limite mínimo de 16 anos de idade para a inscrição no RGPS, no intuito de evitar a exploração do trabalho da criança e do adolescente, ancorado no art. 7º, XXXIII da Constituição Federal. Entretanto, essa imposição etária não inibe que se reconheça, em condições especiais, o tempo de serviço de trabalho rural efetivamente prestado pelo menor, de modo que não se lhe acrescente um prejuízo adicional à perda de sua infância.
3. Nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o art. 7º, XXXIII, da Constituição não pode ser interpretado em prejuízo da criança ou adolescente que exerce atividade laboral, haja vista que a regra constitucional foi criada para a proteção e defesa dos Trabalhadores, não podendo ser utilizada para privá-los dos seus direitos (RE 537.040/SC, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, DJe 9.8.2011). A interpretação de qualquer regra positivada deve atender aos propósitos de sua edição; no caso de regras protetoras de direitos de menores, a compreensão jurídica não poderá, jamais, contrariar a finalidade protetiva inspiradora da regra jurídica.
4. No mesmo sentido, esta Corte já assentou a orientação de que a legislação, ao vedar o trabalho infantil, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo. Reconhecendo, assim, que os menores de idade não podem ser prejudicados em seus direitos trabalhistas e previdenciário, quando comprovado o exercício de atividade laboral na infância.
5. Desta feita, não é admissível desconsiderar a atividade rural exercida por uma criança impelida a trabalhar antes mesmo dos seus 12 anos, sob pena de punir duplamente o Trabalhador, que teve a infância sacrificada por conta do trabalho na lide rural e que não poderia ter tal tempo aproveitado no momento da concessão de sua aposentadoria. Interpretação em sentido contrário seria infringente do propósito inspirador da regra de proteção.
6. Na hipótese, o Tribunal de origem, soberano na análise do conjunto fático-probatório dos autos, asseverou que as provas materiais carreadas aliadas às testemunhas ouvidas, comprovam que o autor exerceu atividade campesina desde a infância até 1978, embora tenha fixado como termo inicial para aproveitamento de tal tempo o momento em que o autor implementou 14 anos de idade (1969).
7. Há rigor, não há que se estabelecer uma idade mínima para o reconhecimento de labor exercido por crianças e adolescentes, impondo-se ao julgador analisar em cada caso concreto as provas acerca da alegada atividade rural, estabelecendo o seu termo inicial de acordo com a realidade dos autos e não em um limite mínimo de idade abstratamente pré-estabelecido. Reafirma-se que o trabalho da criança e do adolescente deve ser reprimido com energia inflexível, não se admitindo exceção que o justifique; no entanto, uma vez prestado o labor o respectivo tempo deve ser computado, sendo esse cômputo o mínimo que se pode fazer para mitigar o prejuízo sofrido pelo infante, mas isso sem exonerar o empregador das punições legais a que se expõe quem emprega ou explora o trabalho de menores.
8. Agravo Interno do Segurado provido. (g.n.)”
(STJ, AgInt do AREsp n. 956.558/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, Julgamento: 02/06/2020, Publicação: 29/06/2020)
2) Conclusão
O direito não pode ser conivente com a dupla penalização destes indivíduos, que na infância e na adolescência sofreram exercendo funções laborativas em idade contraindicada, e na vida adulta não poderiam nem ao menos utilizar tal período para fins previdenciários.
Portanto, se crianças e adolescentes foram expostas ao trabalho em idade inadequada, nada mais justo que ao menos esse período seja considerado para fins de aposentadoria.
Mesmo que tenha sido proferida em caráter excepcional e diante da devida comprovação da atividade laborativa rural no caso concreto, essa recente decisão do STJ tende a beneficiar muitos segurados!
Este artigo foi útil para você? Espero que sim! Também estou te disponibilizando essa Ficha de Atendimento a Cliente Para Causas Previdenciárias, para facilitar o seu trabalho com os seus clientes. Para recebê-la gratuitamente basta preencher o formulário abaixo com o seu melhor email.
Gostou do artigo? Então confira os outros artigos do blog Desmistificando o Direito! Sempre publicamos conteúdos relevantes para nossos colegas previdenciaristas, de uma forma didática e desmistificada.
Fontes:
AVILA, Fábio. STJ admite o cômputo do trabalho rural anterior aos 12 anos de idade. Previdenciarista, 2020. Disponível em: <https://previdenciarista.com/blog/stj-admiteocomputo-do-trabalho-rural-anterior-aos-12-anos-de-ida.... Acesso em: 01/07/2020.
BRASIL. Instituto Nacional do Seguro Social, Ministério da Economia e Diretoria de Benefícios. Portaria Conjunta n. 7, de 9 de abril de 2020. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 14 de abril de 2020. Disponível em: <http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-conjuntan7-de-9-de-abril-de-2020-252275418>. Acesso em: 02/07/2020.
____________. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial n. 956.558 - São Paulo. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Publicado em 26 de junho de 2020. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGeneri.... Acesso em: 01/07/2020.
Fonte:jusbrasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário