O plenário da Câmara dos Deputados
aprovou nesta segunda-feira (12) por 450 a favor, 10 contra e 9
abstenções a cassação do mandato do deputado afastado Eduardo Cunha. A
medida põe fim a um dos mais longos processos a tramitar no Conselho de
Ética da Câmara dos Deputados, que se arrastava por 11 meses e
interrompe o mandato de um dos políticos mais controvertidos dos últimos
anos. Com o resultado, Cunha perde o mandato de deputado e fica
inelegível por oito anos, mais o tempo que lhe resta da atual
legislatura.
Rogério rebateu argumentos da defesa e
de aliados de Cunha, segundo os quais o fato de ele ter mentido sobre a
existência de contas no exterior em depoimento na Comissão Parlamentar
de Inquérito (CPI) da Petrobras é um crime de menor gravidade. O relator
acusou Cunha de ter faltado com a ética e o decoro parlamentar ao
utilizar de manobras para postergar o processo. O relator disse que
Eduardo Cunha omitiu, ao longo de anos, da Câmara dos Deputados e nas
sucessivas declarações de renda, a propriedade de milhões de dólares em
contas no exterior.
O advogado de defesa de Cunha disse que o
parlamentar está sendo submetido a um linchamento e que o parecer do
Conselho de Ética que pede a cassação do mandato do peemedebista não
conseguiu a prova material da existência de contas no exterior. Já
Eduardo Cunha disse que o processo contra ele, que pode resultar na
cassação do seu mandato, é de natureza política e não tem provas. Ao
fazer sua própria defesa no plenário da Câmara, Cunha atacou o governo
do PT, disse que está sendo perseguido e que o processo é uma
“vingança”. “Eu estou pagando o preço de ter o meu mandato cassado por
ter dado continuidade ao processo de impeachment. É o preço que eu estou
pagando para o Brasil ficar livre do PT”, disse o deputado Eduardo
Cunha (PMDB-RJ).
Aliados de Cunha tentaram até o fim uma
última manobra. O deputado Carlso Marin (PDB-RS) apresentou uma questão
de ordem para que fosse votado um projeto de resolução no lugar do
parecer do Conselho de Ética, o que poderia resultar numa pena mais
branda, como a suspensão de mandato. A iniciativa foi indeferida por
Maia. Segundo o presidente da Câmara, os deputados iriam votar, como
fizeram, o parecer do Conselho de Ética, pois o projeto de resolução
“não é objeto de deliberação do plenário, assim não é possível receber
emendas, fazer destaque em matérias constantes dos autos”, disse.
Marun ainda tentou recorrer da decisão e
pedir a suspensão da sessão, mas o pedido não recebeu apoio do
plenário. Diante do resultado Maia deu seguimento à sessão com as falas
dos deputados inscritos. Depois que quatro parlamentares se
manifestarem, dois a favor e dois contra, os deputados aprovaram um
requerimento pelo encerramento da discussão. Durante todo o processo de
votação, Cunha permaneceu em frente à Mesa, conversando com deputados.
Na noite desta segunda-feira, os
deputados aprovaram o parecer do Conselho de Ética que pediu a cassação
do mandato de Cunha por ele ter mentido durante depoimento na Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras sobre ter contas secretas na
Suíça que teriam recebido dinheiro do esquema de pagamento de propina
envolvendo a Petrobras e investigado na operação Lava Jato.
Nega ter contas
Durante todo o processo, Cunha negou que
ser o proprietário de quatro contas no exterior apontadas pela
Procuradoria-Geral da República como sendo dele e de seus familiares.
Cunha disse que apenas tem trustes, tipo de negócio em que terceiros
passam a administrar bens do contratante, e que os valores têm origem em
operações comerciais e no mercado financeiro, como a venda de carne
enlatada para países da África.
Segundo o relatório aprovado no Conselho
de Ética, de autoria do deputado Marcos Rogério (DEM-RO), os trustes
foram usados pelo presidente afastado da Câmara para ocultar patrimônio
mantido fora do país e receber propina de contratos da Petrobras. O
deputado diz no parecer que Cunha constituiu os trustes no exterior para
viabilizar a “prática de crimes”.
Trajetória
Eleito para a presidência da Câmara dos
Deputados em fevereiro de 2015 por 267 votos, derrotando em primeiro
turno o candidato do governo Dilma, Arlindo Chinaglia (PT-SP) que obteve
136 votos, Cunha teve a sua trajetória marcada pelo aparecimento de que
atuava como lobista no esquema de corrupção envolvendo a Petrobras e
também duro embate que promoveu contra o governo da ex-presidenta Dilma
Rousseff.
Com uma campanha montada em cima da
insatisfação da base aliada do governo, Cunha, após a sua eleição,
começou um processo de distanciamento e enfrentamento com o governo. A
tensão crescente resultou, em julho, daquele ano no anúncio do seu
rompimento com o governo Dilma Rousseff. Na ocasião Cunha disse que
passaria a integrar as fileiras da oposição. Ele também começou a
trabalhar para que o PMDB tomasse a mesma postura.
Operação Lava Jato
O anúncio do rompimento ocorreu em meio a
escalada das denúncias que levaram o procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, a incluir o nome de Cunha em uma lista com o nome de
políticos suspeitos de integrarem o esquema de corrupção e pagamento de
propina envolvendo a Petrobras e investigado na Operação Lava Jato.
Entre as denúncias estava a feita pelo
ex-consultor da empresa Toyo Setal Júlio Camargo que relatou à Justiça
Federal do Paraná que Cunha lhe pediu propina de US$ 5 milhões. Cunha
acusou o Palácio Planalto de ter se articulado para incriminá-lo.
Embasado pela PGR
Em razão das novas denúncias, o PSOL e a
Rede protocolam, no dia 13 de outubro de 2015, uma representação contra
Cunha no Conselho de Ética. Além dos dois partidos, o documento foi
endossado por parlamentares do PT, PSOL, PSB, PPS, PROS e do PMDB.
A representação foi fundamentada em
documento enviado ao PSOL pela Procuradoria-Geral da República (PGR),
após um pedido formal do partido. Os papéis já apontavam a titularidade
de Cunha nas contas bancárias secretas na Suíça. Os partidos pediam a
cassação do mandato dizendo que Cunha mentiu em depoimento à CPI da
Petrobras, em março, quando negou que tivesse contas no exterior. Na
declaração enviada à Justiça Eleitoral em 2014, Cunha também não
informou ter contas no exterior, apenas uma no Banco Itaú.
Após uma série de manobras que atrasaram
o trabalho do colegiado, em 15 de dezembro, o Conselho de Ética, por
votação de onze deputados a nove, autorizou o prosseguimento das
investigações. A decisão ocorreu horas depois da Polícia Federal ter
feito a Operação Catilinárias, cujo alvo foi o próprio Cunha.
Manobras
Posteriormente, outra manobra de Cunha
levou ao afastamento do então relator, Fausto Pinato (PP-SP), em abril
de 2016. Pinato renunciou à vaga de membro titular no Conselho de Ética
alegando que o motivo foi porque o lugar pertencia ao PRB, partido que
Pinato deixou para migrar para o PP. A deputada Tia Eron (PRB-BA) foi
alçada ao posto de integrante do colegiado no lugar de Pinato.
Com a saída de Pinato, o deputado Marcos
Rogério (DEM-RO) assumiu a relatoria do processo contra Cunha que
praticamente retornou à estaca zero, tendo sido concluído somente em 14
de junho de 2015 quando o colegiado aprovou o parecer pela cassação do
mandato do peemedebista.
Impeachment
Em 3 de dezembro de 2015, horas depois
do PT retirar o apoio a Eduardo Cunha no Conselho de Ética, Cunha
aceitou um dos pedidos de impeachment apresentados contra Dilma. O gesto
foi apontado por petistas como uma clara retaliação pela perda do apoio
no Conselho de Ética.
Em abril, Cunha presidiu a polêmica
sessão do Plenário da Câmara, feita em um domingo (17), que decidiu pela
autorização para ter prosseguimento no Senado o processo deimpeachment
de Dilma. Com uma duração de 9 horas e 47 minutos, a sessão terminou com
o placar de 367 votos favoráveis e 137 contrários à continuidade do
processo.
Em maio, Cunha foi afastado do mandato
e, consequentemente, da presidência da Câmara pelo Supremo Tribunal
Federal (STF). Em decisão unânime, os ministros seguiram o voto do
ministro Teori Zavaski, relator da Operação Lava Jato, que acolheu o
pedido da PGR, de dezembro de 2015, pedindo o afastamento de Cunha.
“Além de representar risco para as
investigações penais sediadas neste Supremo Tribunal Federal, [a
permanência de Cunha] é um pejorativo que conspira contra a própria
dignidade da instituição por ele liderada”, escreveu Teori. O ministro
também disse que o deputado “não tem condições pessoais mínimas” para
ser presidente da Câmara pois “não se qualifica” para eventualmente
substituir o presidente da República.
Processos
Com a cassação do mandato e o fim do
foro privilegiado, os dois processos contra Cunha que tramitam no STF
devem ser transferidos para a Justiça Federal no Paraná e ficarão à
cargo do juiz Sergio Moro, responsável pela Lava Jato na primeira
instância.
Na primeira denúncia, feita pela
Procuradoria-Geral da República em agosto do ano passado, Cunha é
acusado de cometer os crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
A acusação é de que o ex-deputado teria recebido US$ 5 milhões de
propina relativa a dois contratos de navios-sonda da Petrobras.
A segunda denúncia trata do suposto
recebimento de propina em contas secretas na Suíça. Segundo as
investigações Cunha teria recebido 1,3 milhão de francos suíços de
propina, o equivalente, à época, a R$ 2,4 milhões por atuar na
aquisição, pela Petrobras, de um campo de petróleo na costa do Benin, na
África, em 2011, por US$ 34 milhões (cerca de R$ 58 milhões, à época).
Por essa denúncia ele é réu pelos crimes de corrupção passiva, lavagem
de dinheiro, evasão de divisas e falsidade ideológica com fins
eleitorais.
Prestes a completar 58 anos, Cunha que
foi ao longo de quase dois anos um dos principais políticos do país,
pode sumir do cenário político de Brasília de forma meteórica. Isso
porque a Lei da Ficha Limpa prevê que, em caso de perda de mandato, o
político fique inelegível por oito anos, além do tempo restante para o
fim do mandato.
Fonte: Agência Brasil
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